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ClimaInfo, 3 de julho de 2023

 



  

Uma leitura diária dos muitos assuntos relacionados às mudanças climáticas
3 de julho de 2023


Máquina da desinformação climática é patrocinada pelo agronegócio e a extrema-direita
A desinformação deliberada sobre a crise climática ganhou vasto terreno nos últimos anos no Brasil, beneficiada não apenas por um governo entusiasta das fake news, mas também por uma rede de atores econômicos e de comunicação que sustentou e disseminou as mentiras e distorções. Duas reportagens especiais publicadas na semana passada desfiaram o novelo da desinformação climática no Brasil.
Na Agência Pública, Giovana Girardi, Cristina Amorim, Álvaro Justen e Rafael  Oliveira mergulharam no submundo da negação da mudança do clima que junta  associações rurais, veículos de comunicação próximos do agronegócio, canais digitais e influenciadores ligados a Bolsonaro e encontraram, no meio dessa teia, três nomes que se repetem como os grandes promotores da desinformação. São eles: o meteorologista Luiz Carlos Molion, professor aposentado da Universidade Federal de Alagoas (UFAL); o geógrafo Ricardo Felício, que recém perdeu o posto de professor da Universidade de São Paulo (USP) por abandono das atividades; e o agrônomo Evaristo de Miranda, ex-EMBRAPA e “guru” antiambiental da gestão passada.
O trio tem seus argumentos replicados por veículos de comunicação direcionados ao agro, como Canal Rural e Terraviva (este, de propriedade do Grupo Bandeirantes de Comunicação), e canais que cresceram espalhando as mentiras do bolsonarismo nos últimos anos, como a Revista Oeste.
Nesse esforço de desinformação, a última coisa que parece ter relevância para seus promotores é a ciência. Além da baixa produção acadêmica, chama a atenção a verdadeira máquina de relações públicas construída para sustentar essa caixa de ressonância de mentiras, com empresas vendendo palestras a entidades agrícolas, como a Aprosoja.
A insignificância científica dos negacionistas contrasta com a relevância que obtiveram na seara política, como bem destacou a Deutsche Welle. Além do apoio político dado pelo antigo governo, mantido pelas “viúvas” do ex-presidente, a máquina de desinformação segue se beneficiando com o dinheiro do agronegócio. Com isso, apesar de não contar mais com aliados no Palácio do Planalto, os negacionistas continuam distorcendo e confundindo as pessoas no debate público sobre clima no Brasil.
“As ações orquestradas de desinformação contribuíram para um atraso significativo no processo de tomada de decisão sobre nossos desafios socioambientais mais críticos”, observou Mercedes Bustamante, presidente da CAPES e uma das principais referências científicas sobre clima e Cerrado no Brasil. “Informações técnicas robustas e baseadas em evidências científicas não podem ser consideradas equivalentes a desinformações sem fundamentação”.

Lula quer posição comum de países amazônicos para a COP28
O presidente Lula afirmou na última 5ª feira (29/6) que pretende propor aos países da região amazônica a construção de uma posição conjunta para a Conferência do Clima que acontecerá em novembro em Dubai (COP28), em prol da proteção da maior floresta tropical do planeta.
“Queremos construir com os oito países da América do Sul uma política unitária para que a gente possa chegar na COP28 com a posição correta em defesa dos países que mantêm florestas em pé”, disse Lula, que também citou a necessidade de articulação com outras nações com grande estoque de florestas tropicais, como a Indonésia e a República Democrática do Congo.
“A nossa tarefa é muito grande, e nós não podemos perder um minuto de tempo. O Brasil ficou fora do mundo por praticamente seis anos, seis anos em que o Brasil não era levado a sério em nenhum lugar do mundo. Nós voltamos e queremos voltar, não para o Brasil voltar a ter destaque, nós queremos voltar para que a América do Sul e a América Latina voltem a ter destaque”, complementou o presidente. Agência Brasil e Poder360 noticiaram.
A fala de Lula acontece pouco mais de um mês antes da cúpula dos países da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), que acontecerá em Belém no começo de agosto. Além de marcar a retomada de uma instância internacional praticamente abandonada nos últimos anos, o encontro terá como propósito articular a resposta dos governos da Amazônia à proteção da floresta e à obtenção de recursos internacionais para a promoção do desenvolvimento sustentável.
Por falar em desenvolvimento na Amazônia, representantes dos governos estaduais da Amazônia Legal participaram na última 6ª feira (30/6) de um evento com o Ministério do Planejamento e Orçamento e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), com foco em políticas públicas para facilitar a preservação ambiental e atividades econômicas sustentáveis.
O evento serviu também para o BID anunciar o novo programa “Amazônia Sempre”, que pretende movimentar US$ 430 milhões em recursos para projetos de desenvolvimento sustentável. O dinheiro será liberado na modalidade de grant, sem a necessidade de reembolso dos recursos. O programa priorizará as agricultura e silvicultura sustentáveis, bioeconomia, infraestrutura, cidades sustentáveis, conectividade e população local. Agência Brasil, O Globo e Valor repercutiram o anúncio do BID.

Desmatamento, "rios voadores" e queimadas na Amazônia
Números preliminares do sistema DETER-INPE, sobre o desmatamento no primeiro semestre sinalizam uma grande queda na comparação anual e a terceira menor marca da série histórica, iniciada em 2015. Por outro lado, a quantidade de queimadas em junho foi a maior para o mês em 16 anos.
Faltando sete dias para o fechamento dos dados do primeiro semestre, o acumulado de alertas de desmatamento na Amazônia Legal estava em 2.416 km² – cerca de uma vez e meia o tamanho da cidade de São Paulo. É uma redução de 39% na comparação com os seis primeiros meses de 2022, informam g1 e TV Cultura. Com esse índice, a taxa do primeiro semestre de 2023 só ficou acima das marcas de 2017 e 2018. Nesses anos, os alertas de desmatamento totalizaram 1.332 km² e 2.213 km², respectivamente.
Entretanto, mesmo sem ainda atingir o período-pico de estiagem, quando os focos de incêndio costumam crescer, a Amazônia já registra um aumento expressivo no número de queimadas. Em junho, segundo medições do INPE, foram 2.911 focos até 6ª feira (30), destaca o Metsul. É o maior número dos últimos 16 anos (só perde para junho de 2007, quando foram registradas 3.519 queimadas) e está 13% acima da média para o mês (2.682 focos). De janeiro até 30/06, já foram registrados 8.180 pontos de fogo no bioma.
Junho é considerado o segundo mês da estação seca na Floresta Amazônica, explica ((o))eco. Mas, historicamente, ainda apresenta números relativamente baixos de queimadas. Os meses de maior estiagem – e mais fogo – são julho, agosto, setembro e outubro.
É preciso reforçar que a devastação na Amazônia não é um problema apenas local. Além da perda de capacidade de regular o clima global, o desmatamento amazônico afeta os regimes pluviométrico e hidrológico de outras regiões brasileiras. De cada 100 árvores derrubadas no bioma, outras 22 morrem por falta de água que deixa de ser transportada pelos “rios voadores” – correntes de umidade levadas pelo ar. É o que aponta um estudo do Climate Policy Initiative/PUC-Rio, segundo O Globo.
Cerca de metade da chuva na Amazônia é reciclada na própria floresta, antes de retornar ao oceano. Os “rios voadores” garantem o aumento de chuvas no Centro-Oeste e no Sul, permitindo a manutenção de rios e a irrigação de campos e plantações. Mas, com menos árvores, há menos chuvas e menos recursos hídricos.

Leilão de linhas de transmissão tem grande disputa e deságio de mais de 50%
O primeiro leilão da área energética do governo Lula, voltado para o segmento de transmissão de energia elétrica, foi marcado por uma grande disputa pelos nove lotes licitados, um alto deságio médio, de 50,97%, sobre a Receita Anual Permitida (RAP) prevista pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), de R$ 2,5 bilhões, e a entrada de novos atores nesse setor.
Os projetos deverão receber investimentos de R$ 15,3 bilhões, informa a Agência Brasil, e vão aumentar a capacidade de escoamento da eletricidade eólica e solar gerada no Nordeste. Os lotes incluem construção, operação e manutenção de 6.184 km de linhas de transmissão e subestações com capacidade de transformação de 400 megavolt-amperes (MVA). Os ativos serão instalados na Bahia, no Espírito Santo, em Minas Gerais, Pernambuco, Rio de Janeiro, São Paulo e Sergipe, informa a epbr. Segundo o ministro de Minas e Energia, o leilão ampliará a quantidade de usinas de geração limpa no Nordeste e em outras áreas do país, destaca o Valor. “Os investimentos desse leilão e os mais de R$ 40 bilhões que faremos até março de 2024 serão capazes de destravar mais de R$ 200 bilhões em investimentos no setor de geração de energia limpa e renovável no Brasil”, disse.
O leilão também surpreendeu por ter seus dois maiores projetos vencidos por empresas menos tradicionais no setor elétrico, que desbancaram grandes grupos do segmento. De acordo com o UOL, a ANEEL minimizou a preocupação quanto à capacidade de novos entrantes de tirar os projetos do papel, já que as regras foram aperfeiçoadas para evitar essas situações.
Estadão, Folha, UOL e Poder 360 também repercutiram o leilão.
Em tempo: A Eternit deixou o tóxico amianto para trás e está investindo em telhas com geração solar. Primeiro foram telhas solares de concreto. Agora, vai fabricar telhas solares de fibrocimento, produto inédito no Brasil e que visa a popularizar a fonte de energia. Para demonstrar a viabilidade, a Eternit procurou concessionárias de energia e, em parceria com a ONG Revolusolar, tem buscado moradores nas comunidades Chapéu Mangueira, Babilônia e Ladeira Ari Barroso, na Zona Sul do Rio de Janeiro, para um projeto-piloto. A ideia é selecionar uma residência, fornecer e instalar telhas fotovoltaicas de fibrocimento e entender a eficácia da insolação e outros quesitos técnicos. “A telha vai direto para o telhado: é só tirar a comum e trocar por essa (de fibrocimento)”, diz Luís Augusto Barbosa, presidente da empresa. “É só ligar como se fosse um painel fotovoltaico qualquer, tem um cabeamento, um suporte”, explica, em entrevista ao Estadão. Segundo o gerente de desenvolvimento de Novos Negócios da Eternit, Luiz Lopes, o programa Minha Casa Minha Vida está analisando o produto para saber se é viável sua incorporação às construções populares.

Transição energética no Brasil passa longe do gás fóssil
Os defensores do programa Gás para Empregar  [quem???] e do uso do gás fóssil como “ponte” para a transição energética deveriam ler o artigo de Suzana Kahn, da COPPE/UFRJ, no Valor. De forma técnica e clara, ela explica o óbvio: apostar nessa alternativa no Brasil é caro, poluente e irracional.
“Para a Europa, os Estados Unidos e outros países, o gás é uma fonte de energia que pode ser usada na transição energética, já que é abundante e com custo competitivo. Este, porém, não é o caso do Brasil. Em nossa matriz energética, já com enorme parcela de fontes renováveis, o aumento do uso do gás para gerar eletricidade nos levaria para direção contrária à transição, pois é também um combustível fóssil, que gera emissões de carbono.”
A análise de Kahn não é nova e foi apontada pelo estudo “Vulnerabilidades do setor elétrico brasileiro frente à crise climática global e propostas de adaptação”, da Coalizão Energia Limpa. Além de mostrar que não há sentido econômico e ambiental em investir na produção de eletricidade à base de gás fóssil, o trabalho reitera que a melhor opção de geração elétrica para o Brasil é um sistema hidro-solar-eólico.
“As mudanças climáticas vão impactar cada vez mais o sistema brasileiro de energia, tornando o abastecimento frágil. Precisamos investir em resiliência, adaptação e diversificação. Contudo, isso deve ser feito sem novos investimentos em fósseis e com resguardo dos Direitos Humanos e dos Povos Tradicionais. O Brasil pode exercer um papel estratégico na geopolítica global, sendo pioneiro na transição energética viabilizada a partir de um sistema hidro-solar-eólico. Isto permitiria a redução dos custos da energia elétrica e uma maior competitividade global dos produtos brasileiros, o que, por sua vez, contribuiria para a retomada da economia e a redução das desigualdades sociais”, ressalta o relatório.
Quanto ao uso industrial do gás fóssil, Kahn explica que “teria sentido se fosse com custo baixo. Caso contrário, nossa indústria perderia competitividade global”. O que não é o caso do Brasil, cujas reservas de gás fóssil, em sua grande maioria, são associadas ao petróleo, e em alto mar.
“O Brasil deve ser criativo na busca de uma industrialização moderna, seguindo um modelo próprio e em consonância com suas riquezas naturais. O que é bom para a Europa e para os Estados Unidos não nos atende necessariamente. Nós podemos seguir um modelo de industrialização mais original, de vanguarda, baseado nas fontes de energia abundantes e variadas que temos”, avalia a especialista.

Falta de recursos compromete ação imediata para reduzir emissões de metano
Um levantamento da Clean Air Task Force (CATF) sobre a destinação de recursos ao redor do mundo para reduzir as emissões de metano, um dos gases de efeito estufa mais poderosos, mostra que os gastos atuais representam uma fração muito pequena, de quase 10%, dos cerca de US$ 119 bilhões necessários para limitar as emissões de metano nos setores de agricultura, energia e resíduos para manter o aumento da temperatura global abaixo de 2oC. O financiamento para redução do metano representou menos de 2% do financiamento climático internacional em 2019 e 2020.
“Existe uma incompatibilidade fundamental entre a importância de reduzir as emissões de metano e o financiamento disponível para fazê-lo neste momento”, destacou Jonathan Banks, da CATF. “Reduzir rapidamente as emissões de metano é necessário para manter as metas climáticas globais dentro do alcance, e é a melhor maneira dos financiadores climáticos maximizarem o retorno de seus investimentos em termos de graus de aquecimento evitados nos próximos 20 anos. No entanto, os níveis atuais de financiamento internacional para a mitigação do metano estão muito aquém do que precisamos”.
O relatório da CATF identificou barreiras ao financiamento para demanda e oferta. Pelo lado da demanda, destacam-se problemas como a dificuldade dos governos em traduzir as metas de redução de metano em projetos que possam atrair financiamento público e privado, a falta de capacidade nacional e subnacional para estruturar projetos de qualidade e a escassez de propostas específicas para o metano. Já pelo lado da oferta, encontram-se problemas como a falta de interesse de doadores em financiar a mitigação do metano, a falta de "champions" nesse assunto dentro dos bancos de desenvolvimento, e o foco insuficiente na redução de metano como um resultado desejado em projetos existentes para agricultura e resíduos.
A Bloomberg deu mais informações sobre a análise.
Em tempo: Um relatório divulgado nesta semana pela Agência Internacional de Energia fez a conta. Se a indústria de petróleo e gás gastasse US$ 75 bilhões, montante que equivale a apenas 2% de sua receita líquida em 2022, para conter as emissões de metano até 2030, isso manteria o setor no caminho para atingir a neutralidade líquida até meados deste século. "A redução do metano na indústria de combustíveis fósseis é uma das opções mais baratas para reduzir as emissões de gases de efeito estufa em qualquer parte da economia", sugeriu o documento. A notícia é da Bloomberg.

Uruguai enfrenta a pior seca dos últimos 70 anos
Primeiro país do mundo a consagrar o direito à água potável em sua constituição, em 2004, o Uruguai enfrenta sua pior seca em 74 anos, levando moradores a depender de água engarrafada e a protestar pela sua falta.
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epresa Paso Severino - principal fonte de água doce da capital uruguaia, Montevidéu, e seus arredores, onde vivem cerca de 1,8 milhão de pessoas - poderá chegar ao limite em breve, explica O Globo. Na 4ª feira (28/6), restavam apenas 2,4% da capacidade total do reservatório.
A falta de chuvas forçou as autoridades a usar água de uma parte mais salgada do rio Santa Lucia, que abastece a maior parte do Uruguai, tornando a água da torneira imprópria, destaca a ABC. Segundo a Reuters, a raiva pela escassez de água incitou vários protestos nas ruas de Montevidéu.
O presidente uruguaio, Luis Lacalle Pou, declarou emergência hídrica para Montevidéu e toda a área metropolitana. Por enquanto, a água engarrafada está isenta de impostos. De acordo com a DW, os pobres do Uruguai, especialmente atingidos pela estiagem, receberão dois litros de água por dia gratuitamente.
No centro de Montevidéu, trabalhadores cavaram poços no Parque Batlle, apelidado de “pulmões da cidade”, para encontrar fontes alternativas de água, segundo relatos da mídia local reproduzidos pela CNN.
Em tempo: Também afetada por uma seca histórica, a Argentina viu sua produção agrícola agravar a crise econômica do país. A atividade da economia argentina caiu 4,2% em abril na comparação anual, segundo a INDEC, agência oficial de estatísticas do país. Foi a pior queda desde outubro de 2020 e muito pior que o declínio de 1,5% previsto pelos analistas, devido à queda da produção agrícola. A Reuters explica que a Argentina é o maior exportador mundial de soja processada, o terceiro maior fornecedor de milho e um importante fornecedor de trigo, mas a colheita foi afetada pela severa seca.

No lugar de neve, chuva: estudo aponta para risco crescente de deslizamentos em montanhas
Um novo estudo de pesquisadores do Laboratório Nacional Lawrence Berkeley, do Departamento de Energia dos Estados Unidos, mostra que as mudanças climáticas estão diminuindo a ocorrência de nevascas nas áreas mais altas do Hemisfério Norte. No lugar da neve, está caindo chuva.
A maior ocorrência de chuvas nas áreas montanhosas intensifica a perda da cobertura de neve, o que pode comprometer bacias hidrográficas que dependem do gelo das montanhas. A depender da intensidade, as chuvas podem gerar o transbordamento de lagos glaciais e a ruptura de barragens, com o risco de inundações e deslizamentos de terra para quem vive ao redor ou abaixo dessas áreas. Os riscos são significativamente maiores nas cadeias montanhosas da porção ocidental da América do Norte e o Himalaia, na Ásia.
A análise, publicada na última semana pela revista Nature, indica que a ocorrência de chuvas nas regiões montanhosas também pode aumentar com os eventos extremos mais frequentes. Mais chuvas e chuvas mais fortes

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