Sidney Amaral apresenta a exposição Identidade na CENTRAL Galeria de Arte, com curadoria de Rodrigo Villela. A mostra abre no dia 07 de outubro de 2015, às 19h.
O artista apresentará obras que propõem uma aproximação entre África e Brasil através do eixo comum da violência e da discriminação racial; temas que são tanto históricos quanto atuais. A impossibilidade de rastrear suas origens devido à ausência ou apagamento de registros da escravidão e a alardeada, mas pouco concreta, democracia racial brasileira, são algumas das temáticas abordadas através de imagens. Como parte do processo criativo, Amaral se apropria de fotografias como base documental para suas pinturas. O curador da mostra, Rodrigo Villlela, destaca a intrínseca relação entre a documentação histórica e o trabalho do artista, conectados por meio de precisas escolhas de imagens icônicas e por meio do gesto pictórico, ao imprimir traços contínuos e profundos.
A exposição ficará aberta para visitação gratuita até 05 de dezembro de 2015.
Leia o texto do curador, Rodrigo Villela:
Identidades
Sidney Amaral atua sobre fronteiras: seu trabalho encontra lugar em limites tênues, entre a crônica visual e a memória, entre a ficção e a realidade. Nesta mostra, o artista atuou a partir de registros fotográficos de terceiros. Escolheu elementos representativos de cenas - como recortes das imagens - e partiu para a pintura.
A ideia da individual nasceu em conversas no seu ateliê, onde se podia ver fragmentos de corpos, retratos, pinturas de crianças em situação de desamparo. Desse espectro, optamos por aguçar seu olhar para as questões de identidade, relacionando sua inserção na família, seu contexto social e político e sua visão de mundo.
Sempre bem humorado, o meditativo Sidney é absolutamente incisivo no seu posicionamento político. Daí o caráter de colocar em movimento seus pensamentos, expressos nas obras aqui apresentadas. A escolha das cores sempre se faz presente, numa tentativa de valorizar tanto os tons mais contundentes - a exemplo do vermelho sangue - aos mais sutis - como os muitos brancos dos fundos dos retratos de RG.
Seus trabalhos são marcados pela agilidade da pintura, pela escolha criteriosa de materiais e por gestos contínuos e firmes. Além disso, o caráter figurativo de suas obras pode ser associado - pela própria escolha cromática - à pintura brasileira, muitas vezes tida como naify. Há intersecção também com a narrativa, vinculado ao universo da fotografia e da ilustração (sem falar no cinema): os caminhos são muitos.
Tudo isso para dizer que esta mostra representa um grande passo para Sidney, pois traz uma aposta em significativas mudanças de traço, corte e cor, com resultados contundentes.
Na entrada da sala expositiva, como um preâmbulo, um menino empunha um estilingue, atirando uma pedra inexistente no guache, em direção ao expectador: literalmente, a educação pela pedra.
Na série "Identidade e família", o artista apresenta reproduções ampliadas de fotografias de RG de membros familiares. "Quem somos?", "de onde viemos?", "qual minha árvore genealógica?", "quais nossas cores?". Muitas as questões norteiam essa obra, motivada pela falta de informação dos avós sobre suas origens africanas e por toda narrativa que se perde devido à traumas. O passado se torna inacessível.
Se do passado há pouco, restam presente e o futuro. Na série "Corpo no conflito", o artista apresenta guaches que retratam cenas das manifestações marcantes de 2013, com fragmentos de imagens nos quais ora embaralham mocinhos e bandidos, ora enaltece os belos corpos rebeldes em ações violentas. Ao contrário de se perguntar as razões da revolta, as interrogações miram o futuro: "como reagir?", "para onde caminhar?", "vai sobrar pra quem?".
As perguntas de Sidney geralmente vêm acompanhadas de um olhar cru sobre a realidade, sempre do ponto de vista dos oprimidos, independente da cor da pele. Depois de atirar pedras, derramar sangue, bambolear, Sidney olha para a origem e as contradições da infância marginal, baseado em registros jornalísticos realizados em metrópoles brasileiras: meninos atrás de grades não alcançam bolas-de-gude, um menino alado segura um rifle e por aí vai.
Ainda quanto à cor da pele, que permeia toda mostra, Eduardo Viveiros de Castro ilumina a questão: "Se você olhar a composição étnica, cultural, da pobreza brasileira, você vai ver quem é o pobre. Basicamente índios, negros." (El Pais, 29/9/14). Realizado este percurso de entrar profundamente na estrutura da cor por meio do que está por trás dela, o artista se rende ao riso, apostando na força transformadora de quem "nasceu num lugar que virou favela, cresceu num lugar que já era", parafraseando Caetano Veloso; e apresenta a série "Conflito íntimo", pinturas à óleo em grandes dimensões de fortes personas negros, em sua plenitude. O riso presente em alguns personagens não seria provocado pelo grotesco, por um sentimento de superioridade ou por ser satânico, de acordo com as categorias do riso de Baudelaire. Daí o riso solto e libertador, duro e íntegro como uma pedra.
Voltando à questão inicial do registro fotográfico, se quando a fotografia "entrou em cena, a pintura já estava começando, por conta própria, sua lenta retirada do terreno da representação realista" (como afirma Susan Sontag, em Sobre a fotografia), Sidney Amaral retorna à representação, a partir da mesma fotografia, embaralhando assim a visão instrumental e a poética, numa procura profunda não só pela sua identidade, mas pela de todos nós.
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