Pular para o conteúdo principal

ITAÚ CULTURAL - A CASA DA FOTOGRAFIA -THAÍS CARAMICO


tamanho da letra    A-    A+
TEXTO thais caramico   FOTOS roberto almeida

É por uma daquelas ruelas voltadas para os canais de Amsterdã que você vai passar e talvez nem perceber que no número 609 da quase indizível Rua Keizersgracht está o museu de fotografia Foam, espaço inteiramente dedicado à arte de desenhar com a luz. A fachada tímida se confunde na charmosa e pululante arquitetura de tijolinhos da cidade. No entanto, se olhar para o alto, você vai ver que acima da placa luminosa, na qual a palavra Foam brilha nas cores branca e vermelha, está cravado na parede: Museu Fodor, 1861.

Para entender essa história, é preciso voltar no tempo. Mas, antes, ninguém resiste a espiar pela porta e ver como o casarão revela suas influências modernas, que dialogam com outros suportes da arte contemporânea sem negar: estamos na casa da fotografia, espaço reformado pelo renomado escritório de arquitetura Benthem Crouwel, o mesmo que transformou o aeroporto da cidade num dos mais modernos do mundo.

As enormes portas de ferro dão passagem para o olhar ir adiante, sem bloqueios. Cimento queimado, escadarias de ferro ou madeira, tijolos à vista, colunas e tubos aparentes, pé-direito enorme e um jardim nos fundos que, protegido por janelões de vidro, compõe a sala principal do museu feito paisagem. Tudo reto, retangular ou em círculo, os quatro andares se intercalam numa elegante geometria e se multiplicam em “galerias” onde a fotografia reina.

A história do casarão começou com Carel Joseph Fodor (1801-1860), um colecionador de pinturas e ilustrações holandesas. Em 1863, o sobrado e patrimônio da cidade foi aberto ao público como o primeiro museu de arte moderna do país. Até que, cem anos depois, todas as obras integraram a coleção permanente do Museu de História de Amsterdã. Entre 1993 e 2000, quem ocupou o endereço foi o Instituto de Design Holandês. O Foam surgiu apenas no dia 13 de dezembro de 2001.

Há 11 anos, a fotografia era vista na Holanda como uma arte em destaque, mas nenhuma galeria tratava o assunto como ele merecia. “Havia muitos fotógrafos bons que trabalhavam com jornalismo ou publicidade e que achavam que Amsterdã tinha de ter um espaço dedicado integralmente a todos os estilos fotográficos. A ideia era ter um lugar em que se pudesse apresentar mais do que exposições”, conta a diretora de comunicação do Foam, Merel Kappelho, durante entrevista no café do museu.

O lugar oferece tudo o que essa arte pede, e por isso está mapeado como um dos principais nomes no assunto. Exibe fotógrafos consagrados, premia jovens talentos, tem um departamento educativo e de pesquisa ativo e ainda uma revista de fotografia, impressa quatro vezes ao ano, que é referência mundial. E, além de oferecer “assinaturas”, uma espécie de amigos do Foam faz a venda de edições limitadas das impressões expostas através do site e de uma loja pop-up. E o museu é também um dos organizadores da inédita feira de fotografia da cidade, a Unseen Amsterdam, que acontece em setembro.

“É um desafio se manter atualizado, mas para isso temos uma filosofia bastante firme”, diz a curadora Kim Knoppers. Equilibrar os estilos e o nível dos artistas é um dos segredos do Foam. Você pode ir ao museu para ver uma mostra pequena, como a da alemã Nina Poppe, que costura seu olhar por terras japonesas, e de repente encontrar na sala ao lado um recorte da obra de Ron Galella, o paparazzo – ou celebridade? – mais famoso do mundo. “É possível ver aqui fotógrafos de todas as nacionalidades, como o brasileiro Breno Rotatori, que a gente apresentou na sala de novos talentos”, lembra ao falar do paulistano de 23 anos.

Jovens talentos, inclusive, são vistos ali com atenção. Além de investir em pesquisa, o Foam recebe centenas de portfólios, que são analisados cuidadosamente pela equipe de curadores do museu. “Gostamos de apostar nas pessoas e dar o espaço que talvez elas não conseguissem ter em outro lugar. Muitos artistas novos são convidados a expor ou participar de alguma edição da revista”, conta a curadora. O museu também organiza o Prêmio Paul Huf, para fotógrafos de até 35 anos. O vencedor ganha 20 mil euros, uma mostra e a publicação do portfólio numa edição especial da revista Foam Talent – a próxima sai em setembro com a norte-americana Alex Prager.

Em todo o casarão, podem ocorrer mostras de até seis fotógrafos simultaneamente, numa conta que revela a dinâmica do espaço. São, em média, de 20 a 25 exposições por ano e uma preocupação que vai além da programação muito antecipada. “Gostamos de trabalhar com todos os estilos. Ao mesmo tempo que exibimos fotos de moda, podemos mostrar, na sala ao lado, fotos de guerra. Temos paisagem e documentário e, ao mesmo tempo, natureza-morta e arte conceitual. Fazemos um planejamento, mas também contamos com aquilo que está acontecendo no momento, em termos de nomes e técnicas”, diz a curadora Merel.

E o que mudou nesses 11 anos? O mercado da fotografia evoluiu e há ainda mais fotógrafos na cidade e no país do que antes. Hoje, o intercâmbio entre os artistas é muito maior, assim como o diálogo com outras plataformas, mídias e suportes – reflexo que se espalha por todos os lugares. “Percebemos que a fotografia está cada vez mais inserida na produção artística contemporânea da Holanda. Mais do que ir para a rua e registrar, há hoje um movimento grande dos jovens fotógrafos que estão investindo horas numa produção bastante conceitual e buscando respostas desaceleradas”, completa Merel.

Em 2011, a mostra que celebrou os dez anos do Foam tratava exatamente disso. Sob o tema Natureza-Morta, tradicional na pintura holandesa do século XVII, 24 fotógrafos holandeses apresentaram alimentos e flores com um olhar gráfico e inovador. O que valia era o trabalho solitário do artista, uma criação totalmente voltada para a obra produzida dentro do estúdio; analisavam-se formas de, por exemplo, uma porção de batatas. O resultado foi uma composição de luz e sombra, cores e estética – não só em fotos, mas em esculturas e vídeos.

Desde que abriu as portas, cerca de 1,2 milhão de pessoas já visitou o museu. O site, que também é um banco de dados e um canal de compras para as impressões e as edições limitadas, recebe em média 60 mil visitantes por mês. Mesmo com nomes como Anton Corbijn, Inez van Lamsweerde & Vinoodh Matadin e Richard Avedon em seu catálogo, o Foam vive a se reinventar.

Pensando em movimentar e atrair cada vez mais “fãs”, o museu tenta sempre dar um passo novo. Recentemente, abriu uma loja pop-up em um antigo bunker onde expõe trabalhos, além de vender livros de fotografia. Moda, música, cinema e design são as diretrizes escolhidas. A cada temporada, a galeria troca o tema e os livros de cada assunto ganham destaque nas prateleiras. Há ainda palestras e oficinas com profissionais e outros eventos para o público. “Acaba sendo uma vitrine e também um ponto temático voltados à fotografia e aos artistas do Foam”, conta Merel.

SERVIÇO
Foam
Keizersgracht 609, 1017 DS Amsterdã
fone 31 0 20 5516500
Aberto todos os dias das 10h às 18h; às quintas e sextas, o museu funciona das 10h às 21h.
Saiba mais em foam.org

Comentários