Ocupando toda a Central Galeria, a individual de José Rufino marca seus 30 anos de produção com uma série de obras filiadas aos ideais políticos, filosóficos, biológicos e artísticos que estiveram em seu entorno. Teorias evolucionistas, mitologias, ideologias político-sociais, correntes estéticas e manifestos de arte se misturam a símbolos religiosos e citações psicanalíticas, como se tudo fizesse parte do acervo de uma espécie de museu de referências. Aristóteles, Lênin, Stalin, Malevich, Rorschach, Darwin, Sartre, Gorbachev, Duchamp e Beuys aparecem diretamente citados em suas monotipias, pinturas, objetos e esculturas. Uma pintura, que repete o quadrado preto de Malevich, deixa o espectador perceber sutilmente, em seu campo escuro, uma foice com martelo. Em outra, seguindo a mesma citação histórica, um retrato a óleo antigo de Lênin, vindo da Ucrânia, montado sobre grande tela, recebeu em sua testa a mancha vermelha de Gorbachev, que se espalha pela tela maior, como um mapa do fim de um ciclo.
JOSÉ RUFINO - MEMÓRIAS AFETIVAS E POLÍTICAS
Nascido em 1965, filho de ativistas políticos, ligados ao movimento das Ligas Camponesas e neto de senhor de engenho, remanescente das oligarquias do ciclo da cana de açucar, José Rufino tomou contato com a história que se desenrolava no Brasil através de olhares opostos, extremos. O da casa grande do avô, e o outro, estranho, que percebia à sua volta. Visitas que sussurravam, papéis e livros que eram escondidos, reuniões fechadas, questionamentos na escola, olhares de soslaio e uma tensão no ar.
Já adolescente, com a morte do avô, ele toma contato com sua biblioteca e um baú de documentos, cartas e anotações que iriam finalmente ligar os pontos de um desenho que lhe fora escondido até então e do qual apenas essa fruição, incompleta lhe foi possível perceber. Ele inicia uma arqueologia desse passado familiar, onde a vida afetiva misturava-se com uma participação política intensa. Forma-se em paleontologia e é com olhar de paleontólogo que inicia sua pesquisa poética buscando traços de vida ou humanidade nas sequelas deixadas pela história recente do país. A partir dos anos 90 produz instalações que refletem os anos de arbítrio, como Vociferatio (1991-1996), Espaço Colonizado (1992) e Lacrymatio (1996), exposta na Bienal de Havana. Amplia seu escopo, viaja, faz entrevistas, coleta e recebe contribuições espontâneas de parentes, vítimas e testemunhas da repressão no Brasil, e produz uma grande instalação para a XXV Bienal de São Paulo, com o título Plasmatio, one apropria-se de documentos originais e mobiliário construindo um discurso, uma simbologia que se articula em torno das relações humanas nestas condições extremas.
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